08/12/2020
Fronteiras Fechadas
Desde que vi arder a
Notre Dame, meu coração se partiu um pouco.
Depois trincou cada vez mais um pedaço ao ver Veneza, Londres, Nova York, ou qualquer das cidades
que amo esvaziadas, abaladas, exauridas.
Neste momento agudo de
pandemia, quando nos exasperamos com o confinamento ou com o tédio, o que me
mais me incomoda - e deveria mesmo - é o constrangimento.
As pessoas ficaram sem
emprego, sem renda, sem comida ou casa. Outras pessoas morreram ou perderam afetos e
familiares. Para muitas pessoas a perda de referências não foi só cultural, mas
invadiu as mais íntimas esferas da sua existência.
Para mim, restou a empatia. Quis a vida que o meu extrato social e a
minha estabilidade funcional me garantissem o mesmo salário no final do mês, todos os meses pandêmicos. Diante dos
desafios gigantescos que a maior parte da população está enfrentando, as minhas contribuições para movimentos de
ajuda social são paliativos tendentes a preservar, mais que tudo, a humanidade que existe em mim.
Como nós sairemos
desse abalo nas nossas referências
(sociais e culturais) só podemos imaginar,
mas uma certeza já se avizinha, a
de que as fronteiras fechadas a serem cruzadas estão dentro de nós mesmos.