Recebi um texto da minha querida Camila, menina que vi crescer, que muito me emocionou, não só pela qualidade do texto, mas também pela sensibilidade das suas palavras:


Harry Potter foi dono de muitas das minhas primeiras vezes: o quinto livro havia sido o maior que eu havia lido, até então. Foi o primeiro livro que me fez chorar. A Pedra Filosofal foi o primeiro livro em inglês que eu cheguei a ler por completo. Foi a primeira vez que eu me VESTI de um personagem e caminhei por um shopping cheio de gente que jamais entenderia o motivo. Foi dono das minhas primeiras madrugadas em claro. Foi o meu primeiro vício. Eram duas ou três da manhã quando a escritora J. K. Rowling divulgou o nome do sétimo e último livro da saga Harry Potter. O lançamento mundial (em inglês) aconteceu no dia 21 de julho de 2007. E eu estava na antiga livraria Siciliano do shopping Iguatemi, esperando pelas caixas que chegariam em algumas horas. Duas ou três pessoas estavam com os olhos vermelhos – eu me perguntei o porquê. Era tarde quando os vendedores da livraria entraram com caixas e mais caixas de exemplares novinhos e pediram para que nós fizéssemos uma fila. Confesso que existe um espaço em branco na minha cabeça entre o momento em que eu o abri pela primeira vez e o momento em que cheguei no capítulo “A Rua da Fiação” – não, esse não é o nome do último capítulo, eu sei. Se você não leu, meu caro, não deve estar entendendo nada do que eu estou falando; se você viu apenas os filmes, talvez ache que estou exagerando. Então, eu peço, dê-se a chance e leia a saga. Eu não prometo que os seus arrepios serão iguais aos meus, eu não prometo que você se sentará na poltrona do cinema – à meia noite do dia 15 de julho de 2011 – e chorará como eu chorei, nem que terá os mesmos motivos que eu para sentir o que eu senti, motivos esses que não cabem escrever aqui por serem pessoais demais. Mas me cabe nesse exato momento – no mínimo – uma última confissão: Harry Potter me salvou. De todas as formas possíveis. Em todos os pontos que hoje formam a minha consciência e as minhas vitórias. Em seus detalhes e em suas palavras frágeis. Talvez um dia você entenda, talvez não. Eu, sinceramente, espero que sim. Farei vinte anos em dois meses e, hoje, fui para a faculdade com uma blusa escrita em letras grandes “I have stuck with Harry until the very end.” (Tradução: Eu fiquei com o Harry até o fim.) Eu terei vinte anos, eu poderia ter setenta, as minhas pernas sempre ficarão fracas quando eu reler os seus livros – como se fosse a primeira vez. Os seus personagens serão meus melhores psicólogos, suas folhas serão minhas melhores amigas, eu prometo, mas essa promessa eu fiz há muito tempo, sem saber. Naquela noite, quando a Andrea me entregou o livro pela primeira vez.

A Warner Bros. (que produz os filmes de Harry Potter) está usando o slogan “Tudo acaba aqui” no pôsteres do último filme, mas eu digo: não acaba. Pois “Hogwarts sempre estará lá para aqueles a que ela recorrerem.” A professora McGonagall não poderia estar mais certa quando disse, em uma das primeiras páginas da Pedra Filosofal:“Ele vai ser famoso, uma lenda. Eu não me surpreenderia se o dia de hoje ficasse conhecido no futuro como o dia de Harry Potter. Vão escrever livros sobre o Harry. Todas as crianças no nosso mundo vão conhecer o nome dele!”Por fim, eu agradeço a J. K. Rowling por ter me concedido uma infância secreta que em silêncio eu guardei no meu coração. E é pra sempre.
(Camila Lopes, 15 de julho de 2011. Escrito logo depois de chegar da pré-estréia do filme Harry Potter e as Relíquias da Morte).
Muito frequentemente me deslumbro com lugares que visito e histórias que leio e me pergunto como é possível tal arrebatamento. Recentemente li um trecho de um livro que lança luzes sobre a questão:
"Penetramos numa história pela porta da escuta interior. A história falada toca no nervo auditivo, que atravessa a base do crânio até chegar ao bulbo do cérebro logo abaixo da ponte de Varólio. Ali, os impulsos auditivos transmitidos para cima para o consciente ou, segundo dizem, para a alma... dependendo da atitude de quem ouve.
Antigos anatomistas falavam de o nervo auditivo dividir-se em três ou mais caminhos nas profundezas do cérebro. Eles concluíram que o ouvido devia, portanto, funcionar em três níveis diferentes. Um deles seria o das conversas rotineiras da vida. Um segundo seria dedicado à aprendizagem e à arte. E o terceiro existiria para que a própria alma pudese ouvir orientações e adquirir conhecimentos enquanto estivesse aqui na terra."*
Talvez esse arrebatamento seja possível quando deixamos entreabertas as janelas da alma.
*Clarissa Pinkola Estés
Camila tem a sensibilidade de Giovana... muito lindo, muito doce, muito verdadeiro! Thanks God pelas histórias que salvam a nossa vida. As histórias antigas que já conhecemos e relemos, as novas, que trazem surpresas por que não esperávamos. A capacidade de nos apaixonar over and over again, de entrar em mundos diferentes, e de esperar a nossa carta para Hogwarts chegar - aos 11, aos 30, aos 40, aos 90...
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